A boca da noite me beija,
num entremeio de suavidade e força,
me suga,
com sua saliva composta de tempo e fúria
sabendo muito bem como usá-la.
A boca da noite é ácida,
nela há os devaneios marginais,
os desejos proibidos,
os segredos escondidos,
nos caminhos dos vira-latas que uivam no cio.
Se a boca da noite me toma,
num coquetel de desdenho e devassidão,
danço, rebolo, e me faço cálice:
graal sagrado e pagão
cheinho de veneno e sabor,
e melanina e caos.
Brinco na boca da noite
recriando céus nada cristãos:
paraíso hedonista,
recanto cínico,
delírio comunista
solidão necessária
poesia,
utopia.
Afinal, não há dúvida de que
quem possua as poetas
não são outros, senão
os braços, o membro e a boca
gulosa e imensa da noite.