sábado, 27 de novembro de 2010

Filha das águas

O curso do rio
determina onde vou...
As vozes das árvores entoam cantigas de consolo
à solidão de uma poetisa fugitiva,
que chora, chora,
derramando lágrimas de lembranças fugidias
alimentando o leito do rio
que dita seu curso.
Mulher medieval
mistério
e
magia
acalantam meu colo.
E o rio, ah, o rio
ele ainda dita as águas que devo seguir...

Àquela que se foi...

Embarcada na intensidade de pesadas nuvens cor de azul-solidão
rogo aos mortais daqui do meu ponto,
do meu porto,
do meu morro...
Velo, sentindo a ausência dos que se foram,
desejando o melhor e a luz necessária
a quem partiu...
amizades são nuvens, nunca leves, mas sempre intensas,
e a ausência dessas
revoga minha fortitude de mármore.
Frieza deixa de ser frieza,
face inerte deixa de ser inerte
e ela ainda me faz falta...
Não é glorioso reconhecer a falta
de quem faz falta, não é honroso
passar e fingir não ver...
Mas sou pedra,
e daqui do morro, porto, ponto
cubro minha face de vergonha e
permito as nuvens passar.
Elas passam, ela passa
eu fico
.

domingo, 21 de novembro de 2010

O homem sob a boina...

À Maximino Basso

“O homem sob a boina é forte e fraco,

É velho, mas é jovem, é santo e algoz...

É mortal com alma imortal...

O homem sob a boina traz em si um carisma jovial,

Uma ânsia de aprender, um gosto pelo saber...

Ainda está aprendendo, mesmo com tanto saber, ainda só sabe que nada sabe...

Pensamos todos nós juntamente com sua pessoa: também sabemos que nada sabemos!

O homem sob a boina é autêntico,

Mas traz em si um pouco de todos: a figura paterna, a luz do mestre,

A sabedoria da filosofia, a humanidade quase perdida...

O homem sob a boina é grande e pequeno,

É sagaz e simples,

É Max, mas também é Basso, é de todos e de ninguém...

O homem sob a boina ensina muito e aprende mais,

Instiga, confronta e ama, sobretudo o seu ofício:

É professor, é educador!

Tamanho prazer é vê-lo presente nos tempos remotos de Heráclito,

De Aristóteles, de Plotino...

Possível é vê-lo flanando junto a Sócrates, procurando o homem junto a Diógenes, e sendo querido tanto quanto Abelardo...

Prazer enorme é ouvi-lo... É vê-lo empolgado com Lévinas,

Extasiado com Heidegger,

Degustando um bom vinho e uma bela poesia.

O homem sob a boina pensativo em silêncio é uma aula eloqüente da mais pura filosofia,

Dispensa o uso da palavra, sua ontologia jovial torna- nos constantemente renovados.

Boina, óculos, colete, jeans e Adidas: mesmo por entre esses artefatos,

Sua figura é impossível de ser apagada.

Seus pergaminhos, jamais serão extintos!

Tornou-se exemplo, tornou-se terno,

Tornou-se aquele ente feito de carne e osso, membro e braço,

A nossa lenda viva, a pedra fundamental, grande figura:

Professor Basso!”



segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Etapa

"Sem lenço e sem documento, eu vou..."
(Caetano Veloso)

Minhas costas fecham um caminho enquanto
minha face abre outros mil.
Sem mochila, bagagem, tudo é novidade,
é espanto, diante o absurdo misterioso
e sempre renovado da vida.
Não tenho nome, chamam-me loucura,
sanidade é o meu defeito,
controvérsias
cores e contra-valores!
Caminhando por aí,
a estrada é quem me conduz
enquanto meu olhar vagueia pela paisagem
meus pés deslizam por entre as pedras,
e a vida, ah, a vida
sem lenço, sem documento, sem nada segue...
segue...
segue.


quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Vendas²

Vendas... vendas... vendas:
nos olhos,
lojas nas praças,
verbo do tu.

Vendas vendendo vadias vendas
Vendas vilipendiando violentamente visões
Vendas tu, o teu próprio ser.

Atentais vossos olhos
às vendas que as vendas vendem,
vendando a humanidade,
vedando a liberdade,
sem ver...
Vendas... vendas...
não se venda!

domingo, 7 de novembro de 2010

Enigma

Encostada nesses ombros sinto mais leve meu pesar
como se carregasse minhas dores e meus medos
na leveza das rosas amarelas.
Sinto-me vulnerável e protegida,
e essa duplicidade me desprotege, me auto-questiona:
sendo frágil, teimo em ser forte!
Sendo forte, forjo-me ser intocável...

Mas sendo assim, afasto e intimido os ombros que buscam minha face,
que procuram uma sutileza inexistente em mim,
que geram esperanças românticas
e se apavoram ao me revelar direta e talvez fria...
Assim se faz meu combate!
Na pinta de heroína há resquícios de fragilidade,
mas só o espelho os revela.

E mesmo que esse ombro me permita descansar
tenho medo, me refugio na solidão
e sigo a história solitária da rosa no jardim...

sábado, 6 de novembro de 2010

Cara pintada

E dizem que um certo olhar não intimida ninguém...
Que as marcas da face não suscitam perguntas...
que o sorriso escondido, enigmático, é só tristeza...
que o chapéu na cabeça
é apenas mais uma forma de esconderijo...

Se os olhos gritam,
se a face não fala,
se o sorriso vai além do riso
e se o chapéu não é tirado,
não há problemas...
pois a dança que nos move
é transmitida além das aparências.

Mais vale uma face alvi-negra repleta de mistério
do que uma aquarela sem respingos de magia.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Ósculo corrupto

Os lábios buscam a perfeição do ósculo,
o corpo, a dança sagrada do prazer:
a volúpia que embriaga-os,
a magia que os contagia.
A janela aberta, convida a Lua,
imperatriz alva, a banhar aqueles corpos
sedentos um do outro.
São amantes,
são noturnos,
dispostos inteiramente a se amarem...
Carícias, gemidos, espasmos
poesia, arte, ardor:
chamas flamejantes,
transfiguram o corpo dos eternos amantes.

Condão

Quando escrevo, não imponho limites: Me derramo, me desvelo, A poesia então num ato de cerzir Emenda minha existência com a dela. ...