quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Anti-notícia


"Porque a dor da gente não é noticiada no jornal..."
(Artur da Távola)

Menos mal...
Não é noticiada, mas é compartilhada:
não por mortais, mas pela lua que me banha
com sua luz branca e fria.
Porque a dor da gente é sentida,
curada e esquecida.
Menos mal...

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Rosas arrancadas

Arranquei as rosas e as pus sobre mim.
Não me deti às dores causadas pelos espinhos,
ao aroma que exalavam,
às cores que pulsavam...
Arranquei as rosas e as pus sobre mim:
não feri minhas mãos tanto quanto meu coração,
não sujei-as tanto quanto meus pés,
mas as arranquei...
Nem por amor, nem por dor,
por nada,
apenas por meu querer,
pra satisfazer meu ego
e vê-las,
junto a mim, faceler...
arranquei as rosas e as pus sobre mim:
para amenizarem minhas dores,
sanar as carência,
apagar as ausências
e me ouvirem falar.
Eis o único motivo simplório
pelo qual matei-as:
matei-as para verem elas também o meu sucumbir...

sábado, 18 de dezembro de 2010

Saia-dela

Na gira da saia dela
um balaio de cores, tantas cores,
tantas flores, muitos sons:
que eu me encanto, fascinada,
não digo nada,
me envolvo, me excito
no balanço do balaio de cores dela.
Na cor da pele dela
histórias sem fim,
melanina, mel e canela,
renascendo no fulgor
na barra da saia da moça de cor.
No emaranhado das madeixas dela
pensamentos martelam
enquanto que as cores dela
o mundo conduz...

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Simples canção

Esta canção vem falar das acusações,
das portas fechadas,
das amizades idas,
das lágrimas perdidas...

Esta canção fala das tristezas,
dos acordes, desacordos,
manias de solidão,
refúgios em vão(s)...

Cancioneiro debruçado
recordando aos fatos,
remoendo os erros,
perfurando, entre farpas, os dedos.

Esta é minha canção,
sem métrica, em sons...
Esta é uma canção,
falando apenas da solidão!

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

B(r)anco Homem

Foram-se...
os frutos, os homens, as brisas;
Jazem ausências, solidões,
vácuos desbotados, envelhecidos,
caixões dispostos a nos acolherem,
sopros vitais desgastados...
A praça permanece, o banco permanece
o homem que ali fazia-se sentado
esta tarde voou.
As folhas caem, as árvores morrem,
as flores murcham,
o homem foi-se,
mas ali, olhe atentamente,
o banco permanece, em seu metal duro...
foram-se e lá está ele.

sábado, 27 de novembro de 2010

Filha das águas

O curso do rio
determina onde vou...
As vozes das árvores entoam cantigas de consolo
à solidão de uma poetisa fugitiva,
que chora, chora,
derramando lágrimas de lembranças fugidias
alimentando o leito do rio
que dita seu curso.
Mulher medieval
mistério
e
magia
acalantam meu colo.
E o rio, ah, o rio
ele ainda dita as águas que devo seguir...

Àquela que se foi...

Embarcada na intensidade de pesadas nuvens cor de azul-solidão
rogo aos mortais daqui do meu ponto,
do meu porto,
do meu morro...
Velo, sentindo a ausência dos que se foram,
desejando o melhor e a luz necessária
a quem partiu...
amizades são nuvens, nunca leves, mas sempre intensas,
e a ausência dessas
revoga minha fortitude de mármore.
Frieza deixa de ser frieza,
face inerte deixa de ser inerte
e ela ainda me faz falta...
Não é glorioso reconhecer a falta
de quem faz falta, não é honroso
passar e fingir não ver...
Mas sou pedra,
e daqui do morro, porto, ponto
cubro minha face de vergonha e
permito as nuvens passar.
Elas passam, ela passa
eu fico
.

domingo, 21 de novembro de 2010

O homem sob a boina...

À Maximino Basso

“O homem sob a boina é forte e fraco,

É velho, mas é jovem, é santo e algoz...

É mortal com alma imortal...

O homem sob a boina traz em si um carisma jovial,

Uma ânsia de aprender, um gosto pelo saber...

Ainda está aprendendo, mesmo com tanto saber, ainda só sabe que nada sabe...

Pensamos todos nós juntamente com sua pessoa: também sabemos que nada sabemos!

O homem sob a boina é autêntico,

Mas traz em si um pouco de todos: a figura paterna, a luz do mestre,

A sabedoria da filosofia, a humanidade quase perdida...

O homem sob a boina é grande e pequeno,

É sagaz e simples,

É Max, mas também é Basso, é de todos e de ninguém...

O homem sob a boina ensina muito e aprende mais,

Instiga, confronta e ama, sobretudo o seu ofício:

É professor, é educador!

Tamanho prazer é vê-lo presente nos tempos remotos de Heráclito,

De Aristóteles, de Plotino...

Possível é vê-lo flanando junto a Sócrates, procurando o homem junto a Diógenes, e sendo querido tanto quanto Abelardo...

Prazer enorme é ouvi-lo... É vê-lo empolgado com Lévinas,

Extasiado com Heidegger,

Degustando um bom vinho e uma bela poesia.

O homem sob a boina pensativo em silêncio é uma aula eloqüente da mais pura filosofia,

Dispensa o uso da palavra, sua ontologia jovial torna- nos constantemente renovados.

Boina, óculos, colete, jeans e Adidas: mesmo por entre esses artefatos,

Sua figura é impossível de ser apagada.

Seus pergaminhos, jamais serão extintos!

Tornou-se exemplo, tornou-se terno,

Tornou-se aquele ente feito de carne e osso, membro e braço,

A nossa lenda viva, a pedra fundamental, grande figura:

Professor Basso!”



segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Etapa

"Sem lenço e sem documento, eu vou..."
(Caetano Veloso)

Minhas costas fecham um caminho enquanto
minha face abre outros mil.
Sem mochila, bagagem, tudo é novidade,
é espanto, diante o absurdo misterioso
e sempre renovado da vida.
Não tenho nome, chamam-me loucura,
sanidade é o meu defeito,
controvérsias
cores e contra-valores!
Caminhando por aí,
a estrada é quem me conduz
enquanto meu olhar vagueia pela paisagem
meus pés deslizam por entre as pedras,
e a vida, ah, a vida
sem lenço, sem documento, sem nada segue...
segue...
segue.


quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Vendas²

Vendas... vendas... vendas:
nos olhos,
lojas nas praças,
verbo do tu.

Vendas vendendo vadias vendas
Vendas vilipendiando violentamente visões
Vendas tu, o teu próprio ser.

Atentais vossos olhos
às vendas que as vendas vendem,
vendando a humanidade,
vedando a liberdade,
sem ver...
Vendas... vendas...
não se venda!

domingo, 7 de novembro de 2010

Enigma

Encostada nesses ombros sinto mais leve meu pesar
como se carregasse minhas dores e meus medos
na leveza das rosas amarelas.
Sinto-me vulnerável e protegida,
e essa duplicidade me desprotege, me auto-questiona:
sendo frágil, teimo em ser forte!
Sendo forte, forjo-me ser intocável...

Mas sendo assim, afasto e intimido os ombros que buscam minha face,
que procuram uma sutileza inexistente em mim,
que geram esperanças românticas
e se apavoram ao me revelar direta e talvez fria...
Assim se faz meu combate!
Na pinta de heroína há resquícios de fragilidade,
mas só o espelho os revela.

E mesmo que esse ombro me permita descansar
tenho medo, me refugio na solidão
e sigo a história solitária da rosa no jardim...

sábado, 6 de novembro de 2010

Cara pintada

E dizem que um certo olhar não intimida ninguém...
Que as marcas da face não suscitam perguntas...
que o sorriso escondido, enigmático, é só tristeza...
que o chapéu na cabeça
é apenas mais uma forma de esconderijo...

Se os olhos gritam,
se a face não fala,
se o sorriso vai além do riso
e se o chapéu não é tirado,
não há problemas...
pois a dança que nos move
é transmitida além das aparências.

Mais vale uma face alvi-negra repleta de mistério
do que uma aquarela sem respingos de magia.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Ósculo corrupto

Os lábios buscam a perfeição do ósculo,
o corpo, a dança sagrada do prazer:
a volúpia que embriaga-os,
a magia que os contagia.
A janela aberta, convida a Lua,
imperatriz alva, a banhar aqueles corpos
sedentos um do outro.
São amantes,
são noturnos,
dispostos inteiramente a se amarem...
Carícias, gemidos, espasmos
poesia, arte, ardor:
chamas flamejantes,
transfiguram o corpo dos eternos amantes.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Meu ar



Porque é deste ato que eu sobrevivo,

porque são dessas asas que saem meu voo,

por causa delas, poesias minhas,

que sobrevivo nesse mundo imbecil.


Cada verso sou eu.

Cada verso contém sangue, lágrima,

dor, riso!

São as minhas brincadeiras mais sérias...

e talvez, as únicas que realmente dizem sobre mim.


Se sou ou não feita de palavras,

isto eu não sei.

Se escrevo divinamente ou ignorantemente,

também não sei.

Sei que a poesia existe,

existe em mim e pra mim!

Sem elas, sinto-me borboleta com asas...

asas sempre vazias!

sábado, 23 de outubro de 2010

Anti-plágio


A CÓPIA JAMAIS SE IGUALA AO ORIGINAL!

A cÓpIa JaMaIs Se IgUaLa Ao OrIgInAl!

a CóPiA jAmAiS sE iGuAlA aO oRiGiNaL!

a cópia jamais se iguala ao original!

A CÓPIA É MERA CÓPIA

CÓPIA

cÓpIa

copia

.....


.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Meus demônios



"Há pensamentos que são orações.

Há momentos nos quais seja qual for a posição do corpo, a alma está de joelhos"

(Victor Hugo)


Em tardes de tempestade, onde os ventos despenteiam as ávores, e brutalmente, atiçam o movimentar pueril, fazendo do céu nublado o protagonista que chora, que de prantos longos e intensos molha a terra, as casas, as mentes, os eus. Aqui na caneca, meu chá quente de gengibre e limão buscam encontrar minha dolorida e rubra garganta... um gole, doi! No segundo... mais dor! E o terceiro, não tão diferente dos outros, é como se sangrasse o canal por onde perpassa minha voz. Mas que voz? Nesta tarde não tenho nada à dizer, senão o silêncio portador do auto-conhecimento. O silêncio que reconhece as feridas, que dialoga com os demônios, que reflete sobre a insanidade dos meus atos. A chuva cai... e as lágrimas desse sujeito que aqui vos fala, não caem nunca! Nem em dias nublados, nem ao sol... no escuro talvez, mas hoje, hoje não!

Um chá quente, um livro de Goethe, uma rede e um edredom: esqueci-me da dor, e lembrei-me das dores. As dores que os demônios sussurram, que os eus escondem, que o mundo exterior tenta perscrutar mas não alcança. É nesse duelo, dor e dores, chá e frio, chuva e sol, que faço arder minha alma, que provoco meu corpo, que deixo de ser mulher, para me tornar universal: ser humano, assim o sou nesta tarde chuvosa...

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Eu

Aqui estou mais próxima da minha loucura,
aqui encontro-me com minha vaga lucidez,
aqui escondo minha face,
aqui revelo quem sou:
não há portas, maçanetas, chaves,paredes...
Não há homens, nem mulheres,
algozes e benfeitores,
nem tão pouco astros e entidades simplórias.
Aqui, nesta carne que se move,
neste corpo que salienta-se,
há um EU humano,
sem gênero, sem sexo, sem classe, sem ofício:
Eu corpo, Eu espírito,
Eu deus, EU deusa,
Eu tudo - Eu nada

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Tua


"Não me cante canções do dia,
pois o sol é inimigo dos amantes.
Cante as sombras e a escuridão,
cante as lembranças da meia-noite..."
(Safo de Lesbos)
E o mistério perpassa o corpo e o universo de uma mulher:
sem luz, apenas chamas,
chama-me tua
mesmo sem eu o ser.

sábado, 2 de outubro de 2010

Chuva que lava, que leva... que rega!

Depois de longa sequidão,
nesta manhã, o céu abriu seus portais!
Fertilizou o solo, com gotas que caíam lentamente...
intensamente!
Cada planta, cada folha verde
cada ser vivo se abriu ao úmido espetáculo...
eu me abri!
Ali, prostrada na terra molhada,
recebendo a dádiva fertilizante, deixando escorrer por entre minha face molhada
a mesma água que fecunda a Mãe,
que rega as plantas,
que lava, que leva...
Diante a chuva,
diante o céu nublado carregado de pesada nuvens,
eu me prostrei,
me deixei lavar,
levar...
e a chuva continuou a cair, me regou, fertilizou a mim e à Mãe Terra.
E fomos uma mais uma vez...
Benditas sejam as gotas dessa chuva que cai,
que nos rega, que nos molha,
que nos lava, que nos leva.

domingo, 26 de setembro de 2010

Religare

Eles são dois...
diante deles a pisada forte e precisa.
São dois que nos religam,
nos matêm firmes, em movimento e também em repouso.
Diante deles a pisada forte e precisa
nos religando com a mãe, com a grande Mãe.
E perante ela, tudo me é sagrado:
todo o desejo repousa em sua presença,
exceto o desejo de desejá-la,
de quem unido à ela,
busca novamente o seu sagrado ventre...
Eles são dois que fazem parte de mim.

Fato



O calor dos trópicos é infernal:

quente, muito quente...

mas de onde tiraram a ideia de que o inferno é quente?

Deve ter sido algum frígido europeu...


O calor dos trópicos é celestial:

quente, muito quente...

afinal, estamos mais próximos do sol!

Será?


O calor dos trópicos é natural:

quente, muito quente...

Emitimos gases na atmosfera

para no final, matarmos a nós mesmos.

Fato.

domingo, 15 de agosto de 2010

Sophia, amante minha

Quando enxerguei-a nua,
ali, tão perto da minha humanidade feminina,
tão próxima da minha insignificancia,
renegando aminha ignorância,
eu a deixei me possuir.
Mas ora, como ser dela, se ela não permite ser minha?
Se ela, mesmo nua, perante mim,
não deixa que eu, sua amante,
a toque, a tenha, a possua por inteiro,
sinto logo a essência de sua frigidez.
Mas não tenho como a extinguir,
não posso tirá-la de minha vida,
sendo ela, tão essencial quanto minha própria respiração.
Comigo, tal ninfa não se porta formalmente,
mas devorá-me,
quer-me inteira!
Sou dela, e ela não é minha!
Sofro pesadas penas por nossa relação,
tenho mais algozes do que amigos,
e eles a desconhecem,
e insistem em insultá-la...
Nas aventuras, desventuras,
vou aclamando-a, amando-a
e vendo o quanto é hedônico
amá-la!!!
Sophia,
acho que sou ternamente apaixonada por ti!

domingo, 8 de agosto de 2010

Nua

Resolvi me portar nua
lançadas as algemas do pudor
minha pele como nunca é capaz de sentir
o trafegar da brisa por entre os poros,
de empiricamente comprovar que o sol
quando aquece, também pode queimar.
Resolvi me apresentar sem máscaras,
sem tecidos, mas cheia de medos,
de fragilidades, de lágrimas que outrora petrificadas
hoje escorrem à luz do dia.
Não quero a liberdade, não quero voar,
nem mesmo sumir,
quero somente na simplicidade complexa do meu ato de existir
ser o que sou, corpo e alma,
mulher, amada e amante...
Não almejo nada senão o agora...
Ser hedonista, o que importa é mesmo viver.
A que lado estou encaminhando minha existência?
Até onde já fui capaz de compreender minha essência?
Minha nudez fala por mim!
O frio que sinto, o calor que gozo,
a brisa que passeia em mim,
eles não são tão importantes,
mas sei de fato que o que realmente importa
é a leitura que faço de tudo o que me cerca.
Ressignificar... ler... recriar:
transgredir!
Mais que nudez,
meu corpo descoberto revela
a chama da vela que clareia o meu ser:
ser Ser, sendo... só!

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Fruto pro(l)ibido

Do rubro fruto colhido carnalmente
o sumo puro do feitiço da história,
de latente sabor, impregnado na memória...
eis assim, a construção da mullher.
Repudiada e sempre lembrada
pelo poder de seu agir,
subjulgada, submissa,
teve em seu corpo estampado
a medalha do pecado.
Mas antes de mero corpo,
grande alma também é feita,
intelecto, corpo,
pecado e santidade...
Mas deste mesmo fruto, pode-se emanar
a libido, a luxúria,
e a tantos faz gozar,
como também a inteligência
de seu leve e presente Ser e Estar.
Mulher,
fruto da árvore do conhecimento
contrário ao Gênese,
tu, a tantos pode ensinar, amar, gozar...

sábado, 31 de julho de 2010

Sagrado ato

"Foi mistério e segredo, e muito mais...
se amar como dois animais!"
(Alceu Valença)
O ato e a potência
de sermos mais que homem e mulher,
nos fazem ser forças, bem mais que meros corpos
atraídos, enrolados, ébrios, absinto!
Dois que dançam,
dois que portam na carne
a incisão do desejo,
do prazer,
da volúpia...
Na cama, somos santos.
Na grama, pietá erótica.
Na lama, animais...
Nosso sexo é intenso e desconhecemos outra forma de nos amar!

terça-feira, 20 de julho de 2010

Fim

Se um passo eu der
se um grito soltar
se um salto eu forçar
tudo poderá ter seu fim...
Se as recordações eu queimar
se na luta eu fraquejar
se o choro fluir
minha solidão irá fruir...
Se meu abrigo desabar
se nas ruínas eu permanecer
se do pó, eu renascer
aí sim, a vida enontrará seu fim....

sábado, 10 de julho de 2010

Amargas Margaridas, tudo isso é vida!

Hoje passeei por um jardim de floridas margaridas,
de flores amargas, margaridas,
de sonhos enterrados feito semente,
de adubos escuros e frios,
mas também eficientes.
Presenciei o desabrochar de uma rosa,
rosa sedenta de vida,
vi um beija-flor roubar a virgindade de uma flor,
vi uma borboleta de asas coloridas
pousando na folha que posava pra mim...
Passeei por um jardim,
vi flores, encantos, dores e desamores
reconheci quando plantei cada umas delas,
recordei o tempo em que colhi o que plantei,
mas consegui, analogamente,
identificar que tudo é vida:
cada réstia de tristeza, amargas margaridas;
cada filete de felicidade, plantio e colheita;
cada movimento da mão, da mãe, da terra...
estou cuidando do meu jardim, e espero que ele também cuide de mim!

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Roubaria tuas vestes...

Roubaria as tuas vestes
para degustar de perto tua nudez,
tua alvura, tua humanidade que
tecidos pesados ousavam esconder.
Roubaria tuas vestes para sentir a quentura anulada
pelos longos tecidos...
Roubaria elas para ver-te melhor,
ver-te profundamente,
carnalmente, humanamente!
Despiria teu corpo, tua máquina, e nela reacenderia
as chamas que o tempo apagou.
Faria-o essencialmente humano, motivo de gozo,
de ardor, de luz...
Faria uma inebriante fogueria com tuas nefastas vestes,
rasgá-la-ias, para que pagassem cruelmente
o crime de terem escondido a brancura de tua pele a tanto tempo.
Diante de ti, dançaria juntamente às brasas,
mostraria-te a leveza de um corpo nu,
extinto de vestes, de pudores,
de rudez...
Faria-o dançar, levitar e corporalmente filosofar!
Resgataria tudo aquilo que outrora
tuas vestes renegara,
reeducaria teu corpo,
pintaria tua alvice com chamas inebriantes,
faria-o levitar!
Volúpias e devaneios o possuiriam
e logo fugiríamos do real, para junto às nuvens
eu, teu corpo tocar...

Tic tac


Perguntei a um transeunte:
'que horas são?'
e com naturalidade, sem espanto, sem reflexão algumas,
respondeu-me:
'são noves horas'
...
Ouvi os sinos da igreja mais próxima soarem, e
em questão de segundos julguei
ser aquele momento imortal.

Mas que horas são?
Meu relógio não marca as horas,
não há ponteiros e nem tão pouco números nele,
meu relógio não escraviza esses vestígios de tempo
na realidade, sequer sei se o tempo existe!
Meu relógio bate bem aqui,
interiormente
sem cordas alguma,
ele é extremamente carnal...
Ninguém o conhece,
ninguém pode vê-lo,
talvez seja sempre atrasado,
não corre nunca!
Mas a imortalidade de suas horas
dura somente o agora:
o agora é sempre sua hora!

terça-feira, 6 de julho de 2010

Puta nostalgia...

Acordei,
pena que a cama estava realmente vazia,
nela jaziam os lençóis que outrora teu corpo perfumava,
teu espaço sempre determinado...
teu desenho que se completava ao meu!

Acordei na imensidão da cama que foi feita pra nós,
do espaço onde cabia a nossa pequenez,
a nossa extensão,
o nosso chamego,
e de repente, sem saber ao certo por quê
quis acordar sozinha!

Quis imperar pelo espaço que julguei precisar,
quis voar longe por minha liberdade
quis amar Narciso,
escolhi a mim!

Nessas manhãs então, onde teu cheiro me incomoda
onde meu corpo insiste pelo teu sexo,
corro e amo a ducha...
mas sei que eu me basto!

Assassinato


Mataram mais uma filha...
deixaram novamente a mãe triste...
escureceram ainda mais o pulmão do grande globo...
e a fumaça nos devora agora!

Mais uma árvore morreu, fora assassinada
por um filhote de trator...
por uma obra humana...
e ninguém chorou!

O ventre natural está ferido
está sendo cada vez mais vilipendiado,
e seu choro soa aos meus ouvidos
e suas dores doem em meu peito!

Até quando?
Até quando todo o verde for revertido em massa cinzenta...

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Mon extase Carmélite


N'import quel jour,
num dia desses,
J'ai apporté le Carmel chez moi, sans le savoir.
levei o Carmelo pra casa, sem saber
J'ai découvert un peu de son essence.
descobri um pouco de sua essência
Il est philosophe, poète et acteur au même temps.
é filósofo, poeta e ator ao mesmo tempo
J'en ai découvert l'extase de Teresa D'Ávila
descobri nele o êxtase de Teresa D'Ávila
Digne d'un poème en français.
digno de um poema em francês
Le Carmel est d'un couleur brun, tropical
o carmelo é de cor morena, tropical
Il est fort e faible au même temps
é forte e frágil ao mesmo tempo
Plein de coubers, des coubers hallucinantes
cheio de curvas, curvas alucinantes
Supérieur aux habits et aux jeûnes
superior a hábitos e jejuns
Il est riant, culturel, audacieux
é risonho, cultural e audacioso
C'est un pur 'mamulengo'
é puro 'mamulengo'
Il a un regard grand et plein
possui um olhar grande e cheio
Plein de sentiment e poésie
cheio de sentimento e poesia
Mon Coeur aujourd'hui c'est Carmélite
meu coração hoje é carmelita
Je m'ai extasié sans sentir, en sentant
extasiei-me sem sentir, sentindo
En se sentant libre, sourriant!
sentir-se livre sorrindo!
Bernini ne le dépeindrait jamais
Bernini jamais o retrataria
Seulement Lacan verrait tant d'envie
Só Lacan veria tanto desejo
Envie d'envahir lr Camel
Desejo de invadir o Carmelo
Lui connaítr par dedans,
conhecê-lo por dentro,
N'import quel jour.
num dia desses.

(Jean de la Croix)
PS: poema presenteado a mim por um grande amigo meu...

Dura existência


"Porque o passado me traz uma lembrança
do tempo que eu era criança
e o medo era motivo de choro
desculpa pra um abraço ou um consolo..."
(Cazuza e Frejat)


Nas noites em que o escuro me sufoca,
eu o intimido e o transformo em luz...
Enquanto monstros horripilantes se abrigam em meu armário
salto da cama, e os transformo em sem teto...
E se a cuca busca me fazer de refeição,
convenço-na a ser vegetariana...
Mas enquanto mostro aos meus medos
a coragem que tenho diante deles,
meus medos mostram-me o quanto
eu consigo disfarçar muito bem.

Há quem afirma sua covardia
e há quem a esconda.
Há quem chora às claras,
e há quem derrama lágrimas somente no escuro:
mas não importa, não importa!
Em todas as pessoas cabem lágrimas e medo...

?


Uma interrogação é um gancho...

Veja!

Quando fincada na carne

dura e áspera do pensamento fere, sangra, perfura.

Mas logo refaz-se:

carne e pergunta.

domingo, 4 de julho de 2010

Os camponeses jazem cansados da labuta
da dança corpórea, revestida de força
num instante profundo
parecem descansar
com pés descalços
...
A lida na terra,
as feridas na alma
as chagas no corpo:
mas a terra acolhe e aterra
as lamúrias deles que,
sol a sol, plantam, aram e colhem...
carinhos feitos no ventre ditoso
da Terra que gira
gira, gira.

Esta noite a lua me sorriu...
em seu trono, em seu reino
fez-se acessível, me olhou,
me sorriu!

Outrora com traços firmes como Ártemis
agora iluminada e simpática como Sophia...
fez-me esquecer dos gols, das dores, do mundo
e me sorriu!

Não enxergo nada:
nem luzes, nem portas
nem homens, nem mulheres,
senão apenas vejo o riso da dela.

Deusa aberta e sensível
a mim, minha eterna musa
até quando minha eternidade durar:
ela me sorriu!

Vi seu sorriso de lânguido raios,
de brilhantes dentes,
de lábios desenhados...

Esta noite foi ela,
foi ela quem me sorriu!

sexta-feira, 2 de julho de 2010


As flautas não soam mais doces quanto outrora, o violino lança agora notas de angústia e cobrança: por que não entoastes outa canção?
O violão, a harpa, a rabeca e o pife reverteram suas musicidades
para o desprezo do poeta e da musa:
a contemporaneidade corrompeu seus versos, sua beleza, sua imagem.
Emaranhando farsa verso e música, poeta poetisa e poesia
lançam-se ao acaso e num ritmo automático a escrita se faz só.
História e historicidade são ambas história, mas não são a mesma coisa
e nem mesmo a mesma história...

O carro de som passa por entre as ruas asfaltadas
plantou um jardim de acordes no grande tapete de piche fazendo florir
a mais bela tragédia da contemporaneidade:
vejam! uma flor de cimento, pedra e pó desabrochou...
Chorosa não quis nem mesmo se portar próxima ao meio fio ou à calçada
ousou nascer e interromper o trânsito
a fazer soar o pesar das buzinas o cantar dos pneus...
Agora a pobre flor de pedra não consegue respirar a poeira de enxofre
a farinha diária, o pão amassado pelo diabo... e fermentado pelos homens!

Óh modernidade, ou pós pós modernidade, como eu a abomino!

"Tenho em mim esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado para gostar de passarinhos
Tenho abundância de ser feliz por isso
Meu quintal é maior do que o mundo..."
(Manoel de Barros)



Este seio que aqui, diante de ti está desvelado
transpira vapor emana desejo...
deste mesmo seio que outrora homens nus já se deleitaram
hoje permanece intacto, virgem, nu.
De mamilos róseos, de pele morena
de fantasias realizadas e outras ainda a se realizarem,
de dóceis traços, de silhueta simples:
aqui mesmo me revelo,
me desvelo,
me dou,
sou.
"Vivo despida de preconceitos e ilusões, à luz da verdade..."
(Luz del Fuego)
Incendeia...
Ilumina...
Clareia!
A voz engasgada, os desejos enrustidos,
a falsa moral pregada
crucifica e martiriza quem ousa transgredi-la.
Incinera...
Abrasa...
Arde...
O corpo tranformado em desgraça,
intérditos por ele todo lançado.
O pequeno problema é que somos todos massa corpórea...
À fogueira aqueles que marginalizam
mas ao mesmo tempo o degustam.
Despir antes os pudores para desnudar o corpo e a mente!
Sejamos Luz e Fogo...
PS: à grande mulher vítima de perseguição por desconsiderar os pudores de seu tempo, aprendamos todos com Dora Vivacqua, condinome Luz del Fuego

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Apolínea e dionisíaca

Sou apolínea quando trago a racionalidade e o equilíbrio
sou dionisíaca quando deixo minha subjetividade florescer.
Apolo está em mim quando estou diante o espelho
Dionísio no espelho cabe também.
Apolo prevalece quando prefiro dar vasão à razão,
mas Dionísio me atrai quando à emoção dou razão...
Apolínea quando estudo,
Dionisíaca quando escrevo...
Meu estar no mundo se faz completo quando integro a lucidez de Apolo à embriaguez de Dionísio!
Sou apolínea sem deixar de ser dionisíaca,
racional, objetiva, lúcida...
Sensível, subjetiva, desvairada...
Raptei Apolo e Dionísio do panteão
e os fiz habitar no Olimpo que sou eu.

Sagrado, segredo feminino revelado

Uma donzela subiu à lua
e nela pôs-se a tocar sua canção mais triste,
derramando uma chuva de pétalas melancólicas
deixando as frias estrelas mais chororsas...
Uma moça sentou-se na lua
e lá, distante dos homens
conheceu seu sagrado, seu segredo
seu lado feminino
que a História apagou...
Uma mulher se fez lua
incendiou e raiou com sua luz clara, alva
o espaço celeste, escuro, duro.
Despertou ao mundo a força de ser MULHER
a não-costela, a não-submissa,
mas a que em Lilith restaura suas forças...
Subiu, entoou cantos, compôs melodias
se fez lua,
e agora, com os pés fincados na terra,
tudo deriva dela.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Flor-Eu

Meus lábios eu não pinto de carmim,
meu colo não perfumo de jasmim,
minhas madeixas não se rendem à autoridade de um pente...
Nos meus pés não cabem saltos,
minhas unhas já vieram feitas,
e meu corpo não se rende à marcas...
Não traduzo versos em francês,
não gosto de canções em inglês,
as joias que uso são frutos da terra!
Sou flor macabra, sou margarida ressequida,
sou planta sedenta... obscura
mística, necessitada de consolo
abandonada num jardim.

Tua luz, meu refúgio

Adormeci emaranhada em teus longos fios de luz branca,
branda, paraste o mundo - silenciaste os acordes ferozes -
entoados pelo pobre instinto pós pós modernidade...
Nossas únicas testemunhas são estrelas dançarinas
ausentes de coreografia alguma.
Enquanto minhas lágrimas dilaceram minha fragilidade
teus raios sangrosos compartilham da mesma dor,
da mesma solidão,
da mesma fruição...
Estes versos que saem do nosso ritual existencial
são gritos melancólicos meus,
são sussurros indecentes teus,
são as sensações fluídas pelos meus pés úmidos
firmes nestas britas azuis de solidão.
Sou capaz de abraçar-te, de encontrar abrigo e força
num copro celeste ausente de Corpo...
Embora estejamos distantes a luz anos uma da outra
sei que neste pesar escuro
tua luz alva
tua luz cândida
tua presença-ausência
oferece teus filetes de luz fria
para eu gozar do aconchego mais perfeito,
sabendo que só neles,
nos teus braços,
sou capaz de encontro abrigo...

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Se ainda (n)esta noite

Se ainda esta noite puderes contemplar o céu
e se saudoso o teu corpo querer o meu
peça às estrelas que te guiem
e te façam pousar aqui.
Se ainda nesta noite fria, pacata e mórbida
a lua não nos unir
direi na linguagem do desejo
o quanto necessito de ti.
Só tu, cavaleiro andante
apazigua meus hormônios,
acalma meu corpo e me vira a cabeça.
(...)
e se mesmo a lua lançar
sobre nós sua carícias frígidas,
seus segredos, meus desejos...
Pedirei,mesmo em pensamento
que ainda esta noite, algo conosco aconteça.

Nossa sentença

As convenções são farsas
que intimidam nossos desejos
os quais são doce como pecado
teus deliciosos beijos.
Se assim tivermos pregado
heresias contra a moral
inclusive no inferno, em chamas
nossos corpos arderão.
Sejamos portanto livres
sem mácula de culpa alguma
pois mesmo em pecado
o céu por nós será tocado...


Lágrimas escorrem pela face coberta de panquê
o rímel, o lápis, a maquilagem
desbotados, desfiguram a cultis empalidecida.
Tantos lançam juízos precipitados
às lágrimas descidas pela face,
mas nem mesmo um vivente
seria capaz de descobrir seus motivos...
o motivo sombrio das lágrimas,
o motivo mortal do pranto,
o motivo ingênuo do choro!
Dor, angústia, lástimas
mais que carregadas,
elas, as lágrimas, dizem silenciosamente
o que os olhares curiosos
almejam saber... mas não sabem.

A um amigo...

Certa noite, numa dessas conversas virtuais, pediram-me para compor um poema:
um poema que falasse dos riso saído
do papo agradável
do inglês não dito.

Pediram-me para compor uns versos
que retratasse a graça da vida,
a música preferida,
a infância perdida.

Queriam que eu transfigurasse nos versos
a singeleza da flora,
a beleza da fauna,
a conquista da alma...
o sabor do saber.

Pediram-me, suplicaram-me,
julgando ser eu poetisa
capaz de tamanha proeza...

Mas não, não conquistei ainda a sensibilidade
de reunir num único poema o singificado de um alguém tão cômico...
Pensei ser um dia borboleta azul,
de anis asas e corpo leve
levado ao vento.
De madeixas negras despenteadas,
de sonhos coloridos no peito,
de asas veladas velozes
de dança tristonha
de dogmas apagados...
Alçando voo, flanando com asas
distribuindo versos
sendo feitas de palavras,
minhas asas eram azuis
na mesma tonalidade das minhas angústias.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Eu e a natureza somos uma única coisa,
um único ser:
faço parte dela, sou ela
ela sou eu e faz parte de mim!
Simbiose íntima,
relação mais que pactual,
intrínseca à existência uma da outra,
uma que é outra, outra que é uma
e ambas são uma.
Natureza sou eu,
Eu sou natureza,
corpos unidos,
mentes em sintonia,
espíritos puros a resplandecer a mesma magia...
O sagrado feminino, a fertilidade de nosso ser,
a perspicácia intuitiva,
tudo num único ser:
faço parte dela, sou ela
ela sou eu e faz parte de mim...

Condão

Quando escrevo, não imponho limites: Me derramo, me desvelo, A poesia então num ato de cerzir Emenda minha existência com a dela. ...